Gosta de ir ao circo ver os truques e performances com Animais Selvagens? Desde macacos a elefantes e não esquecendo os famosos tigres? Saiba que os circos, tal como os conhece, vão deixar de existir, pelo menos no que diz respeito ao uso dos Animais Selvagens.
Isto porque entrou em vigor, no passado dia 23 de fevereiro, a Lei nº 29/2019, de 22 de fevereiro, que reforça a proteção dos Animais utilizados em circo e o resultado da publicação desta Lei é só um: o fim da utilização dos Animais Selvagens neste tipo de espetáculo.
Mas, desengane-se se acha que vamos deixar de ver todo e qualquer tipo de Animal no Circo. A presente Lei aplica-se apenas aos Animais Selvagens, nomeadamente, àqueles que constam dos anexos da Portaria 86/2018, de 27 de março, da qual fazem parte, entre outros, Animais como, leões, ursos, crocodilos, serpentes e focas, pelo que ainda poderá ver espetáculos com os tão famosos Animais de companhia, como cães e gatos, ou de pecuária, tal como admite a própria Lei no artigo 7º nº 3, não se aplicando a esta última categoria.
Ora, o dispositivo legal em causa proíbe por um lado, como já referimos, a utilização destes Animais, mas reforça, por outro, a proteção dos Animais de companhia e de pecuária, que podem continuar a ser usados no Circo, sobretudo no que concerne à sua detenção.
Assim, passa a ser obrigatório o registo dos Animais detidos e utilizados em circo, tendo o promotor do circo de, sempre que possível, identificar o respetivo animal, podendo escolher entre um microchip, uma anilha ou até uma tatuagem, sendo que o registo efetuado deve conter inúmeras informações acerca do animal, destacando-se, aquela que nos parece ser mais relevante, e que se prende com o facto de ser obrigatório conter a identificação do promotor do circo e do detentor do animal, designadamente, nome e morada, o que permite, desde logo, uma proximidade das autoridades competentes ao Animal, criando, dessa forma, uma maior segurança e respeito pelas regras.
Este registo é efetuado no Portal Nacional de Animais utilizados em circo que até à presente ainda não existe, mas que terá de ser estabelecido por Portaria própria a definir pelo Governo. Igualmente, irá ser criado um cadastro nacional por forma a articular todas as informações acerca destes Animais.
Deste modo, uma das inovações constantes na presente Lei refere-se ao registo de todos os Animais utilizados no Circo, bem como dos seus detentores. A nosso ver, esta nova regra revela-se essencial para o bem-estar animal permitindo um maior controlo das condições em que o Animal se encontra. Esta proibição que referimos não se circunscreve apenas à proibição da utilização, mas também à captura e ao treino de Animais Selvagens com vista à sua utilização em circos.
Quanto a estas novas regras, quer em termos de registo, quer em termos de proibição de utilização, captura e detenção, devemos referir que consideramos que são uma mais-valia para a proteção animal.
É certo que os circos comportam em si uma grande tradição que atravessa diversas gerações e que junta famílias à volta de um grande espetáculo, mas seria legítimo usar Animais Selvagens como entretenimento, como meras marionetas a prol da satisfação das pessoas? A resposta é negativa. Devemos olhar para esta proibição como um passo gigantesco para a proteção dos Animais, pelo que consideramos esta Lei um dos pilares fundamentais nessa luta.
Todavia, existe um aspeto que não podemos deixar passar em branco por considerarmos que, em termos práticos, não coloca em primeiro plano o bem-estar e a segurança dos Animais. Esse aspeto refere-se ao regime transitório que encontramos no artigo nº 8.
De acordo com este artigo, os títulos válidos que habilitam a utilização de Animais Selvagens, que se encontrem em vigor, caducam no prazo de seis meses a contar da publicação da Lei, não podendo ser concedidas novas autorizações. Ou seja, a partir do momento da publicação da Lei os títulos caducam e não podem ser solicitadas ou concedidas novas autorizações.
Contudo, e a parte negativa encontra-se aqui, o nº 2 do mesmo artigo permite que os detentores e utilizadores de Animais Selvagens possam requerer uma licença transitória no prazo de seis meses, após a data da entrada em vigor, com um período de duração máxima de seis anos.
Conseguimos perceber o alcance desta norma no sentido em que não podemos relegar para segundo plano os detentores dos animais cujo modo de vida é o circo e cuja atividade profissional envolve a sua utilização. Mas, também não podemos deixar de referir que achamos o prazo de seis anos completamente excessivo, contrariando a nosso ver, o principal objetivo deste dispositivo legal: a proteção dos Animais.
Até porque a própria Lei não deixa os detentores completamente desamparados, tendo-se fixado um regime que cria uma linha de incentivos financeiros à reconversão dos trabalhadores das companhias de circo que voluntariamente procedam à entrega de Animais que detenham e utilizem.
Em suma, consideramos esta Lei como uma nova forma de combater as condições precárias e desumanas em que muitos animais vivem, sendo que esta proibição aliada ao regime contraordenacional previsto na Lei (que remete para o Decreto-Lei nº 260/2012, de 12 de dezembro) é, sem sombra de dúvidas, um passo em frente para o bem-estar Animal.
Por: Flávio Fernandes Marques
BQ Advogadas, S.P., R.L.