A competência dos Órgãos Municipais nos domínios da Proteção e Saúde Animal e da Segurança dos Alimentos

No passado dia 30 de janeiro, dando cumprimento ao disposto no n.º 1 do artigo 4º da Lei 50/2018, de 16 de agosto, foi publicado em Diário da República o Decreto-Lei n.º 20/2019, que procede à transferência de diversas competências relativas ao setor da proteção e saúde animal e à segurança alimentar para as autarquias locais e entidades intermunicipais, dando cumprimento aos princípios da subsidiariedade, descentralização administrativa e autonomia do poder local que regulam o Estado de Direito.

Ora, através deste Decreto-Lei pretende a Assembleia da República adotar uma política de maior proximidade, nas atividades regulamentadas, entre o poder local, a população e as empresas, o que permite que as atividades realizadas nestas áreas se efetivem de forma mais eficiente, desde logo, pela proximidade e pelo conhecimento das autarquias locais quanto à população e quanto às empresas do município que integram, tendo uma noção mais completa e exata das atividades realizadas nesses locais.

No que concerne ao setor da proteção e saúde animal, assunto que nos vai ocupar as próximas linhas, diga-se, que a competência se encontra repartida entre animais de companhia e animais de produção.

Façamos uma breve análise quanto a estas duas categorias para uma melhor compreensão do presente diploma. De acordo com o Decreto-Lei n.º 314/2003, de 17 de fevereiro, animais de companhia dizem respeito a qualquer animal destinado a ser usado ou detido pelo Homem, quer seja no seu lar, para o seu entretenimento ou companhia.

Já os animais de produção, dos quais fazem parte sobretudo aqueles que se relacionam com a atividade pecuária, dizem respeito, de acordo com o artigo n.º 3 do Decreto-Lei nº 64/2000 e Decreto-Lei nº 81/2013, àqueles que o Homem utiliza para a produção de determinadas matérias-primas, isto é, qualquer espécie vivo que é criado ou mantido com o objetivo de produção de géneros alimentícios ou para outros fins agropecuários.

Como referimos anteriormente o presente diploma estabelece diversas competências que se repartem entre os animais de companhia e de produção, sendo que de um modo geral, as competências, agora transferidas, prendem-se essencialmente com a regulação prévia, registo, controlo e fiscalização das atividades.

Quanto à primeira categoria o Presidente da Câmara Municipal passa a deter poderes:
» Sobre os centros de recolha e alojamento para hospedagem de animais de companhia, cabendo-lhe receber a comunicação prévia, nos termos do disposto no artigo 3.º-A do Decreto-Lei n.º 276/2011, de 17 de outubro;
» Sobre os centros de alojamento para hospedagem com fins lucrativos destinados à reprodução e criação de animais potencialmente perigosos;
» Competências ao nível da autorização quer para a realização de Concursos e Exposições que envolvam animais de companhia, quer para a detenção de animais em prédios urbanos.
Por fim, cabe aos municípios a realização de ações ou campanhas públicas sobre profilaxia médica e sanitária.

Quanto à segunda categoria o Presidente da Câmara Municipal passa a deter, sobretudo, poderes quanto ao registo e controlo da referida atividade. Passa assim, a exercer, as competências que estavam entregues à DRAP, competindo-lhe registar e proceder a qualquer alteração do registo no âmbito da classe 3 do Decreto-Lei nº 81/2013 de 14 de junho, bem como proceder ao registo da detenção caseira de espécies pecuárias, assumindo o controlo e a fiscalização das referidas atividades.

Deste modo, as competências que vão agora assumir os municípios neste domínio, reportam-se, essencialmente, a três níveis distintos: ao registo, às autorizações e ao controlo e fiscalização das atividades, sendo que certo que irão dividir essas competências com o Médico Veterinário Municipal, que vê as suas competências serem alargadas nos domínios da autorização e controlo do registo das atividades, assumindo dessa forma uma enorme relevância na efetivação das competências agora transferidas.

Em suma, podemos referir que esta transferência de competências se traduz numa vantagem essencial nesta matéria que não podemos negar: a proximidade entre o poder local e as atividades regulamentadas revela-se essencial em termos de ganhos de eficiência e pode, consequentemente, originar uma maior eficácia ao nível do controlo e de fiscalização destas atividades.

Apesar disso, e não negando que estas novas competências atribuídas aos municípios podem ser uma mais-valia, também temos algumas dúvidas quanto à organização e gestão dos municípios nestas matérias por serem de difícil implementação, não existindo regras de organização efetiva, ficando a organização desta matéria no poder discricionário das autarquias locais.

Por: Flávio Fernandes Marques
BQ Advogadas, S.P., R.L.